sábado, 16 de fevereiro de 2013

Duas coisas distintas da mesma coisa.






ILHADO

Acabou a luz.
Eu estava sozinho em meu apartamento. O sol acabara de se por completamente despercebido naquela cidade barulhenta. Calmo consulto sequencialmente o televisor, o interruptor da sala que agora não sei para que lado liga, o telefone sem fio e sem som e por último a geladeira, que já não vibra.
Procuro pelos quartos, o que ainda posso ver. Maldita hora em que deixei aquele aparelho celular próximo à cama. Eu acho. É só ligar para ele, mas é a segunda vez que pego o telefone para nada.
Será que isso é no prédio todo?
Pela janela vejo um imenso fosso negro, sem fundo. Não consigo ver o asfalto, mas bem ao longe é possível ouvir um som de sirene, ecoando pela cidade e uma brisa a essa altura. Em todas as janelas também falta energia e alguns andares mais para baixo vejo um movimento rápido, um vulto indefinível, que logo volta à invisibilidade plena.
Tomara que isso não demore. E tomara que não chova.
Talvez se eu descesse pelas escadas, mas não. Os passos na escuridão silenciosa serão uma descida ao inferno. Afinal, são vinte e três andares. A cada andar, duas sequências de sete degraus. Então são... Quatorze vezes... Vinte e três... 322! Trezentos e vinte e dois degraus. Que dia. E se eu descer tudo isso e a energia não voltar, eu vou ter que subir novamente, sem enxergar um palmo a frente dos meus olhos. Melhor ficar e esperar. Será que meu vizinho sabe disso?
Vou até o corredor e lembro que não conheço aquele vizinho. Na verdade faz algum tempo que não vejo vizinhos, e detesto quando entro no elevador e tem outras pessoas, sem assunto, aguardando fugir daquela cena terrivelmente incômoda e entediante em que todos vigiam a única saída. Na frente da porta tento bater de forma educada. Três toques, da mão fechada contra a madeira, e espero um pouco. Colo o ouvido na porta. E nada.
Entro pela porta da cozinha e pisando aquele chão frio tento acreditar que essa solidão não vai durar muito. Como beber água nesse breu? Talvez não seja difícil, ainda é possível ver algumas coisas e a memória me diz onde pego o copo. As pupilas já até se acostumaram à situação. A geladeira, a garrafa d'água, o copo. E por incrível que pareça, tamanha distração, encontro o aparelho celular. Como ele veio parar aqui? Não importa, agora eu posso ligar para alguém. Sem sinal. Mas também, quem viria até aqui? Ao menos ouvir outra voz. Ter um sinal de vida. Parece que só resta eu em toda essa cidade. Ilhado, no vigésimo terceiro andar.
Ah... Afundo no sofá. Eu e esse sofá. Se eu pelo menos pudesse dormir. Ou tomar um banho no escuro... Levanto-me em direção à cama. Sigo novamente pelo corredor, de costas para a sala, e de lá ouço um ruído. Apesar das luzes apagadas, posso ouvir aquele som de presença que a televisão produz antes de mesmo de sintonizar, logo adiante ela encontra o sinal, um homem que dirige sozinho numa propaganda de carro pela cidade deserta. Tudo se restabelece. Nada de novo.

17.02.2013

domingo, 3 de fevereiro de 2013

La Niña Blanca

"Sou aquela de que todos falam e ninguém conhece.
E porque não me conhecem, me caluniam,
Enquanto que aqueles que me conhecem não se calam e me defendem.
Todos tratam de evitar conhecer-me, mas todos acabam recebendo minha visita.
E quando por fim me encontram, descansam,
mas eu, nunca descanso."

Atenciosamente,
A Santa Morte.

"Para tu que não crê em mi, te escrevo esta carta para pedirte que não me insultes nem me julgues, posto que sou uma obra mais do teu criador, eu sou o espírito de luz que te levará até quando tua alma se separe do teu corpo e tenhas que render contas da tua vida...
Porque eu não sou um ser satânico, tão pouco diabólico, sou um ser que te pode ajudar, porque sou um anjo que nosso Deus Pai criou. Eu sou a Menina que te vigia, meus braços que te carregam, minhas mãos que te consolam, meus pés que te guian, minha foice que te defende, meu alento alegre que respira, meu mundo em que vive, meu manto que te cobre e te resguarda, e que chegada a hora eu te consolarei."

Atenciosamente,
Santissima Morte


O culto mexicano cristão defendido pela Igreja Católica Tradicional Mexico-USA, que não é aceito pela Igreja Católica Apostólica Romana.


 Acaba por se tornar a crença dos esquecidos, dos excluídos, chegando a angariar muitos devotos de vida desregrada e criminosa. Porém não é essa sua origem, que remete a um sincretismo do cristianismo com crenças indígenas meso-americanas, os astecas e maias, que julgavam ser a morte uma parte do todo, e à esta entidade faziam prece.




Às vezes colorida, às vezes negra, às vezes vermelha, mas quase sempre branca.





Um bom documentário sobre.



Amém.